Um cenário de violação de direitos básicos de algumas comunidades atingidas pelo crime em Mariana da Barragem de Fundão, há quase oito anos, e que permanecem desamparadas. Foi o que a deputada Beatriz Cerqueira (PT), integrante da Comissão de Administração Pública da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), após visitar os Distritos de Pedras (em Paracatu de Baixo, (em Mariana), e de Gesteira, em Barra Longa (Central), pôde constatar.
Foto: Ricardo Barbosa/ALMG
Crime destruiu as nascentes
Na Fazenda Cerceau, os prejuízos foram muitos, segundo a moradora Ana Maria Carneiro Cerceau: 31,5 km da fazenda foram afetados pela lama, com a destruição de sete nascentes e deterioração da qualidade da terra, dificultando o trato dos animais, inclusive pela falta de água.
Ana Maria, que não foi reconhecida como atingida pela Fundação Renova, mora na fazenda há 20 anos. Ela mostrou como era a paisagem antes e depois do rompimento e disse que nunca vai se esquecer da correria do dia 5 de novembro de 2015, quando a Barragem do Fundão, no Distrito de Bento Rodrigues, se rompeu, provocando um verdadeiro mar de lama.
Maior desastre ambiental do Brasil
O crime na barragem de rejeitos de minério controlada pela Samarco, num empreendimento conjunto das mineradoras Vale e BHP Billiton, é considerado o desastre industrial com maior impacto ambiental da história brasileira e o maior do mundo com barragens de rejeitos. Foram despejados 62 milhões de m³ de lama, que chegaram ao Rio Doce, cuja bacia hidrográfica abrange 230 municípios em Minas Gerais e no Espírito Santo.
Não atingida por lama, Gesteira alta sofre com casas trincadas
Na comunidade de Gesteira, a 18 km de Barra Longa, onde passaram pela Igreja Nossa Senhora da Conceição, por uma escola local e ouviram pessoas da localidade. Gesteira é dividida em “parte baixa”, atingida diretamente pela lama da barragem, e “parte alta”, onde a lama não chegou, mas que sofreu impactos posteriores com o fluxo de caminhões e máquinas da Renova.
No site da fundação, consta que 22 família de Gesteira foram afetadas, com a destruição de estabelecimentos de comércio, da igreja, de um campo de futebol e da escola da localidade, porém o número de família impactadas chega a 70.
Foto: Ricardo Barbosa/ALMG
Várias pessoas relataram que respiram poeira contaminada com rejeito, que a água está contaminada e suas casas, trincadas, sem ainda terem recebido manutenção ou qualquer compensação.
Moradores entregaram à Beatriz Cerqueira uma cópia do acordo coletivo firmado entre o Ministério Público Federal, Defensoria Pública, a comunidade e as empresas envolvidas, para reurbanização do local e reassentamento de 36 famílias. O documento, que não informa prazo de execução, detalha que será firmado um convênio com o município de Barra Longa, o qual receberá os recursos para o reassentamento das famílias.
Mas a comunidade reclama que há cerca de 70 casas trincadas também na parte alta, devido ao impacto do tráfego intenso de caminhões e máquinas pesadas utilizados nas obras. Simone Silva, professora em Barra Longa, mora numa das casas na parte alta que está com várias trincas em função das obras numa escola próxima.
“Eles foram fazer a escola com maquinário pesado de rolos compressores e caminhões e foi o que causou esse dano a essas estruturas das moradias daqui.”
Simone Silva, professora em Barra Longa
Ela completou que a escola está desativada, pois está cheia de goteiras e não tem condições de ser utilizada: “Tanto que as crianças foram estudar numa comunidade vizinha daqui”.
Simone diz ainda que, mesmo no caso dos reconhecidos pela Renova como impactados, os valores pagos são insuficientes. Ela mostrou sua casa, que está toda trincada e precisaria ser demolida, para se construir outra moradia.
“Estão pagando um valor único que varia de R$ 500, R$ 8 mil, R$ 12 mil para casas que estão com risco de desabamento. A pessoa tem que pegar o recurso, fazer a obra e em 90 dias já estar na casa”, reclamou.
Renovação do crime
A deputada Beatriz Cerqueira (PT) resumiu o quadro que observou durante a visita. Ela disse que se deparou com uma “situação absurda de violação de direitos humanos” nessas comunidades, que permanecem desamparadas pela atuação ineficiente das responsáveis: “Até o momento, essas empresas continuam renovando o crime”.
A parlamentar lamentou a situação da igreja local, considerando-a emblemática. “O crime tirou a igreja da vida das pessoas, que é o lugar da fé, mas também do encontro, da festa. A Renova, não só não cuidou, como deixou o prédio num estágio pior de deterioração”, criticou.
Também questionou os valores colocados no acordo, que não corresponderiam à realidade.
“Teriam que construir novas casas. E nós estamos falando de um crime que não aconteceu mês passado, mas há quase oito anos”, condenou.
Saiba mais em: Comissão de Acompanhamento do Acordo de Mariana comprova descaso com comunidades atingidas
Fonte: ALMG