Mesmo após recorde de incêndios florestais, governador barra ações de fortalecimento da Defesa Civil e de brigadas de incêndio, enfraquecendo ações de combate e prevenção

Poucos meses após Minas Gerais atingir a maior quantidade de queimadas dos últimos 14 anos, o governador Romeu Zema (Novo) veta a destinação de recursos para fortalecer a Defesa Civil e ações de estruturação das Brigadas Civis e Voluntárias de Incêndio.
Em agosto do ano passado, o estado registrou mais de 3,6 mil focos de incêndio em áreas de vegetação, o que representa o maior número para o período desde 2010. No entanto, mesmo diante desse número alarmante, o governador Zema vetou proposta da deputada Beatriz Cerqueira (PT) que visava autorizar o Estado a destinar recursos públicos para investimento na Defesa Civil e Brigadas como medida de prevenção e combate a incêndios.
A emenda, apresentada à Lei Orçamentária Anual para o exercício de 2025, previa a alocação de recursos para o fortalecimento da Defesa Civil e aquisição de materiais, como equipamentos de proteção individual (EPIs), bombas d’água, veículos adaptados e outros materiais essenciais para operações de combate ao fogo.
O texto também propunha a realização de treinamentos e capacitação das brigadas civis e voluntárias, a promoção de campanhas de conscientização e educação ambiental para prevenção de incêndios, entre outras ações.
“Se já sabemos que mudou, que chove mais num curto espaço de tempo, que o calor será maior, nos resta investir naquilo que podemos prevenir ou diminuir danos salvando vidas. Quantos estudos hoje, financiados ou incentivados pelo Estado estão em curso para isso? O quanto o Estado está investindo na sua infraestrutura para socorrer a população”, questionou a parlamentar.
A deputada ainda destacou a falta de estrutura da Defesa Civil nos municípios mineiros. “A maioria dos nossos municípios não tem uma Defesa Civil bem estruturada. Precisam de ajuda. Quem está lá faz o seu melhor, mas é preciso investimento público. O Corpo de Bombeiros está com um déficit de cerca de 25% de pessoal. São estas pessoas – Defesa Civil e Corpo de Bombeiros – que nos socorrem, lutam pelo resgate rápido e nos orientam. O lugar de lutarmos por mais investimento é o Orçamento do Estado. Eu lutei, os deputados aprovaram e o governador vetou”, ressaltou Beatriz Cerqueira.
Para a deputada Andréia de Jesus (PT), o veto do governador Zema representa um grave retrocesso, expõe a população a riscos e pode custar vidas. “A Defesa Civil atua na prevenção, proteção e resposta a desastres, sejam eles de origem natural ou antrópica. Com o veto do governador, os mineiros ficam ainda mais vulneráveis. Sem equipes e insumos suficientes. A resposta aos desastres se torna lenta e ineficaz, colocando em risco a vida de inúmeras famílias. É inadmissível que, diante de um cenário tão crítico, recursos essenciais sejam bloqueados por uma decisão administrativa”, ponderou.
Já a deputada Bella Gonçalves (PSOL) classificou o veto como “extremamente grave”. Segundo a parlamentar, o governador não tem preparado o estado para lidar com as mudanças climáticas. “Zema vetou recursos que tentamos aprovar para a Defesa Civil do Estado de Minas Gerais, o que é extremamente grave. Zema não tem preparado o estado para lidar com as pessoas, com cuidado e dignidade, no contexto das mudanças climáticas”, destacou.
Em entrevista ao Brasil de Fato MG, o presidente do Sindicato de Engenheiros de Minas Gerais (SENGE-MG), Murilo Valadares, destacou que a Defesa Civil deveria ser prioridade de qualquer governante responsável.
“Zema está totalmente equivocado ao vetar recursos para uma área prioritária. Ele deveria incrementar o orçamento para prevenir desastres, mortes e incêndios em Minas Gerais”, afirmou.
DESMONTE DAS POLÍTICAS DE COMBATE A INCÊNDIOS
O veto não é o primeiro ataque de Zema ao setor. Em janeiro do ano passado, o governador publicou o Decreto nº 48.767 com alterações na gestão do Programa de Prevenção e Combate a Incêndios Florestais, denominado Força Tarefa Previncêndio (FTP). Segundo especialista em meio ambiente ouvido pelo Brasil de Fato MG, a desestruturação promovida pelo governador pode prejudicar o combate às queimadas no estado e contribuir para o aumento dos focos de incêndio.
Apenas no mês de agosto de 2024, Minas Gerais registrou mais de 2 mil pontos de queimadas, um aumento de 107% em comparação com o mesmo período de 2023, quando foram registrados 1.029 focos de incêndio. Ainda segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), no ano passado o estado registrou maior quantidade de focos de incêndio dos últimos 14 anos.
Entre as mudanças promovidas pelo governo Zema com a publicação do decreto está a exclusão das brigadas populares e comunitárias, que desempenham um papel fundamental no combate aos incêndios, muitas vezes atuando de forma voluntária. Para o doutor em ecologia e brigadista da Brigada Cipó, Fernando Figueiredo Goulart, ao não reconhecer formalmente a atuação das brigadas, o governo Zema enfraquece o programa como um todo.
“Nós conhecemos e atuamos nos territórios. Uma brigada faz intercâmbio com a outra. Temos uma rede de apoio e atuação incrível e esse reconhecimento é inclusive científico. Porém, a medida do Zema invisibiliza esse processo e nos retira dos espaços de tomada de decisão sobre a gestão dos incêndios de grande escala. Isso aumenta o risco da sociedade, dos ecossistemas e da biodiversidade”, criticou o brigadista.