
Nos últimos anos, a saúde em Minas Gerais tem sofrido com a ineficiência e o abandono por parte do governo de Romeu Zema (Novo). O desmonte tem gerado uma crise devastadora na saúde pública do Estado, que vai desde o fechamento de hospitais e abandono de ambulâncias até a falta de equipes e insumos básicos. Um descaso que tem custado vidas.
Confira seis situações que evidenciam o sucateamento da saúde pública em Minas Gerais sob o governo Zema:
1 – DESMONTE DA REDE HOSPITALAR
Hospital Júlia Kubitschek
Em meio ao aumento de casos de doenças respiratórias no estado, o Hospital Júlia Kubitschek, em Belo Horizonte, beira o caos. A unidade é mais um hospital da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig) que enfrenta as consequências do abandono da gestão do governador Zema. Referência em maternidade de alto risco e em especialidades de alta complexidade, hoje a unidade opera com mais de 100 leitos fechados por falta de profissionais, materiais essenciais, além de equipamentos quebrados.
O bloco cirúrgico, com sete salas, tem apenas três em funcionamento por falta de pessoal. Dois blocos hospitalares com capacidade para 80 leitos estão com obras inacabadas. Duas alas com 16 leitos de pós-operatório permanecem totalmente desativadas. Na Unidade Neonatal, apenas sete técnicos de enfermagem atendem dez leitos de UTI neonatal — quando o ideal seria nove. No CTI adulto, 12 dos 40 leitos estão fechados por falta de equipe.
Além de limitar a capacidade de atendimento, o número reduzido da equipe tem levado os profissionais à exaustão. Em uma das salas de cirurgia, técnicos relataram que quatro profissionais se desdobram ao limite para administrar medicamentos prescritos por cinco médicos.
“Temos trabalhadores atendendo dois setores ao mesmo tempo. Isso coloca em risco tanto o trabalhador quanto o paciente que está sob seus cuidados. Além disso, temos ainda as obras intermináveis, que também colocam todos em risco”, denuncia a diretora executiva do Sindicato Único dos Trabalhadores da Saúde (Sind-Saúde/MG), Neuza Freitas.
Hospital João XXIII
A situação no Hospital João XXIII, referência nacional no tratamento de traumas e queimaduras graves, também é alarmante. A unidade sofre com a falta de anestésicos e materiais básicos como luvas, pinças e esparadrapos, além da sobrecarga de seus profissionais.
A difícil realidade enfrentada pelos funcionários e pacientes foi mostrada em matéria do jornal Hoje em Dia, em outubro do ano passado. Na época, diante da falta de insumos, funcionários eram obrigados a improvisar com garrafa PET para substituir bolsas coletoras de urina.
Segundo profissionais ouvidos pelo Estado de Minas, a falta de materiais básicos é um “problema crônico”, que muitas vezes leva os funcionários e até familiares das vítimas a arcar com os custos dos itens.
A situação, que já era grave, piorou desde o início do ano com a decisão do governo Zema de fechar o bloco cirúrgico do Hospital Maria Amélia Lins (HMAL) e transferir os pacientes para o Hospital João XXIII. A medida causou sobrecarga na unidade com relatos de pacientes pelos corredores aguardando há vários dias por cirurgias ortopédicas, situação constatada por deputados do Bloco Democracia e Luta durante visita da Comissão de Direitos Humanos.
Às vésperas do carnaval, a falta de macas na unidade levou o hospital a reter o equipamento das ambulâncias do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), afetando a rotina de atendimento do serviço de emergência, cujas equipes precisaram aguardar horas para ter a maca liberada e atender novos chamados. Desde então, a situação se repete, principalmente às segundas-feiras e nos fins de semana.
O diretor do Sindicato dos Trabalhadores da Rede Fhemig (Sindpros) e funcionário do João XXIII, Carlos Martins, relatou ao jornal Estado de Minas que os funcionários usam até cadeiras de banho para transportar os pacientes. Há ainda relatos da presença de escorpiões e baratas na unidade. Segundo um funcionário do hospital, em uma semana foram encontrados nove escorpiões no CTI.
Profissionais e pacientes também sofrem com problemas na refrigeração. Em meio às temperaturas elevadas do mês de fevereiro, a UTI pediátrica registrou 30º, expondo os pacientes a riscos de infecção devido ao calor excessivo. Em abril, uma pane no ar-condicionado do bloco cirúrgico levou à suspensão de todas as cirurgias eletivas por horas.
Além de colocar em risco o socorro aos pacientes, todos esses problemas prejudicam o trabalho dos profissionais do hospital, que ainda enfrentam um quadro reduzido de funcionários.
Hospital Risoleta Neves
O descaso com a saúde pública se repete no Hospital Risoleta Tolentino Neves. Superlotado, somente neste ano, a unidade já precisou barrar a entrada de novos pacientes duas vezes, antes mesmo de o governo decretar situação de emergência devido ao aumento das doenças respiratórias.
Com capacidade para 90 pacientes, em 28/04/25, o hospital registrou 171 atendimentos simultâneos. No dia seguinte, o número ultrapassou o dobro do suportado, com 124 pacientes. A superlotação vem se tornando um problema crônico na unidade, que, desde 2023, tem picos de demanda que extrapolam a capacidade operacional de atendimento.
Segundo Cristiano Túlio Maciel Albuquerque, endocrinologista pediátrico e diretor de mobilização do Sindicato dos Médicos de Minas Gerais (Sinmed-MG), a estagnação dos repasses é a origem da crise que afeta o Risoleta, cujo déficit mensal é de mais de R$2 milhões.
O rombo financeiro traz como consequências a falta de investimentos em infraestrutura e de reajustes adequados aos profissionais, que também enfrentam sobrecarga de trabalho.
Na pediatria, por exemplo, onde a equipe mínima deveria ter seis pediatras por plantão, há dias em que apenas dois médicos estão presentes. “Tem dia que só tem um, e já houve dias em que não havia nenhum pediatra”, relatou Cristiano ao jornal Estado de Minas.
Hospital Infantil João Paulo II
No centro da crise respiratória que avança por Minas Gerais, o Hospital Infantil João Paulo II, em Belo Horizonte, é mais um retrato do colapso da rede pública de saúde. Referência no tratamento de doenças respiratórias graves, atualmente, o hospital opera com a capacidade extrapolada em 120%. A unidade tem enfrentado uma média de 400 atendimentos por dia, com todos os leitos de UTI pediátrica completamente ocupados.
Apenas em abril, foram registradas 2.989 internações de crianças de até 9 anos por doenças respiratórias no estado — um aumento de quase 70% em comparação com março, que contabilizou 1.763 hospitalizações.
Profissionais denunciam que o Hospital João Paulo II enfrenta um “déficit crônico” de pessoal há anos. Segundo relatos, se antes os plantões contavam com até 10 pediatras, atualmente há turnos em que apenas dois médicos atendem toda a emergência. “O máximo que chega hoje são cinco pediatras no plantão. Isso é muito abaixo do necessário para o volume e a complexidade dos casos que o hospital recebe. Acaba que os setores ficam ali com escala mínima”, alertou o presidente do Sinmed-MG
Para ele, o principal entrave enfrentado pelo Hospital João Paulo II é a falta de uma política pública consistente para a contratação de profissionais. Os salários defasados pagos pelo governo Zema e os reajustes abaixo da inflação dificultam não só a admissão, mas também a permanência dos trabalhadores. “Hoje, o Estado tem o maior déficit salarial do setor de saúde. A perda para a inflação chega a 36%. Com o aumento da contribuição previdenciária, esse déficit chega a 40%”, ressaltou.
2 – FECHAMENTO E PRIVATIZAÇÃO DE HOSPITAL
Como se não bastasse os hospitais já estarem sobrecarregados, o governador Zema ainda fecha unidade em funcionamento. Em janeiro deste ano, funcionários e pacientes foram surpreendidos com o fechamento do bloco cirúrgico do Hospital Maria Amélia Lins (HMAL). Transferidos para o Hospital João XXIII, a medida causou sobrecarga na unidade com relatos de pacientes pelos corredores aguardando há vários dias por cirurgias ortopédicas, dentre outras.
Na época, a Fhemig alegou que a medida era necessária para “manutenção dos equipamentos” e que o bloco seria reaberto tão logo fossem comprados novos aparelhos. No entanto, três meses depois o governo publicou edital para entregar a gestão do HMAL para entidades privadas ou consórcios públicos de saúde, confirmando sua estratégia de sucatear para privatizar.
Diante de inúmeras arbitrariedades encontradas no processo de terceirização do Hospital, os deputados do Bloco Democracia e Luta solicitaram a suspensão do edital junto ao Tribunal de Contas do Estado (TCE-MG). O pedido se soma a outros dois, sendo um impetrado pelo vereador da capital mineira, Pedro Rousseff, e o outro pelo Sind-Saúde-MG.
A partir das denúncias protocoladas, o TCE-MG proibiu a assinatura do contrato de terceirização da gestão do Hospital e solicitou a entrega de documentos que comprovem a conformidade do certame.
O Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) também se manifestou contrário ao processo e determinou, no dia 1º/05, a reabertura da unidade com a manutenção integral dos serviços do HMAL, incluindo a reativação do bloco cirúrgico e a restituição dos leitos desativados. Segundo a decisão assinada pelo desembargador Pedro Aleixo Neto, da 7ª Câmara Cível do TJMG, o governo do Estado e a Fhemig têm um prazo de 10 a 15 dias para garantir o funcionamento integral da unidade.
3 – SUCATEAMENTO DO HOSPITAL DO IPSEMG
O abandono da gestão Zema também atinge o hospital do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado (Ipsemg). Mesmo depois de ter aumentado em mais de 80% a contribuição dos servidores à assistência médica, problemas antigos têm se agravado. Faltam equipamentos essenciais como aparelho de ressonância, mamógrafos e tomógrafos. Em janeiro deste ano, servidores realizaram protesto com um ‘velório’ contra o sucateamento do hospital, denunciando o descaso do governo Zema, que impõe condições insalubres a trabalhadores e pacientes.
Matéria do jornal O Tempo relata a angústia de paciente com câncer que teme a progressão da doença enquanto aguarda sem saber quando conseguirá fazer um exame de ressonância.
Para o especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental, Fausto Pereira dos Santos, que já atuou como secretário de Estado de Saúde, a manutenção dos equipamentos de saúde exige uma gestão mais eficiente. Segundo ele, por se tratar de serviços essenciais, não deveria chegar ao ponto de interromper os atendimentos. “Essa questão dos equipamentos, também no Amélia Lins, é de ordem profissional: manutenções e substituições de aparelhos precisam ser ágeis. Os contratos devem incluir reparos preventivos. Problemas eventuais acontecem, claro, mas nada justifica um ano sem solução. Isso aponta para uma falha de gestão”, afirmou Fausto, em entrevista ao jornal O Tempo.
4 – HOSPITAIS REGIONAIS: OBRAS EM ATRASO E SEM PERSPECTIVA
Para piorar, a conclusão das obras de seis hospitais regionais segue sem perspectiva de se tornar realidade. Promessa de sua campanha em 2022, Zema não divulga prazos concretos para as unidades previstas em Conselheiro Lafaiete, Sete Lagoas, Divinópolis, Governador Valadares e Teófilo Otoni. Em Juiz de Fora, o governador já admitiu que não entregará a obra. Enquanto isso, milhares de mineiros sofrem com a falta de atendimento médico hospitalar.
Leia mais: Hospitais regionais de MG: obras atrasadas e promessas quebradas marcam gestão Zema
5 – MINAS LIDERA INTERNAÇÕES POR FALTA DE SANEAMENTO BÁSICO
O descaso de Zema com a saúde da população mineira também aparece no triste ranking da falta de saneamento básico. Em 2024, o estado liderou o número de internações hospitalares devido a doenças relacionadas à falta ou ineficiência dos serviços de saneamento, com 47.612 casos. A taxa é de aproximadamente 22,3 internações para cada 10 mil habitantes, bem acima da média nacional, de 16,2, e do Sudeste brasileiro, de 13,1.
No mesmo quadro, Minas também tem destaque negativo no número de mortes causadas por essas doenças. Com 1.778 óbitos, o estado é o segundo no ranking, atrás apenas de São Paulo.
Os dados divulgados em matéria do G1 são da pesquisa do Instituto Trata Brasil que aponta que apenas 43,7% do esgoto é tratado em Minas Gerais. Apesar do pouco serviço prestado, em 2021, o governo Zema autorizou a Copasa a cobrar taxa de esgoto de todos os municípios mineiros, inclusive daqueles que não têm o serviço de saneamento básico. Diante dos números alarmantes e passados quatro anos da instituição da cobrança, a pergunta que fica é: onde está o dinheiro do povo, governador?
Entre as doenças transmitidas por insetos que levaram mais pessoas aos hospitais mineiros está a dengue. No ano passado, o estado liderou os casos no Brasil, respondendo por praticamente um em cada três casos prováveis de dengue contabilizados em todo o país.
Para o doutor em saneamento, meio ambiente e recursos hídricos pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), João Bosco Senra, o cenário é consequência do descaso do governo estadual.
“O que mais explica esse cenário triste é um descaso do governo do estado, de Romeu Zema, com a saúde pública e com a questão do saneamento. Não tem aplicado recursos nessas áreas, mas sim em questões mais ‘politiqueiras’”, destacou Senra ao Brasil de Fato MG.
6 – 47 AMBULÂNCIAS ABANDONADAS
Retrato da ineficiência e incompetência do governo Zema, 47 ambulâncias do SAMU, doadas pelo Ministério da Saúde, ficaram paradas durante meses em um terreno do antigo Aeroporto Carlos Prates, em Belo Horizonte.
Os veículos, que são essenciais para o atendimento de serviços de emergência e ajudam a salvar vidas, foram abandonados pelo governo Zema, expostos ao tempo e ao desgaste externo, enquanto deveriam estar nos municípios, atendendo a população. Na época, o descaso com o bem público foi denunciado por parlamentares do Bloco Democracia e Luta.