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Abandono e ameaças: comunidades atingidas pela mineração são ouvidas por deputados do Bloco Democracia e Luta na ALMG

Audiências realizadas nesta semana requeridas por deputados da oposição ouviram denúncias feitas por indígenas, quilombolas, produtores rurais e populações urbanas impactados por barragens e atividades minerárias.

Comunidades atingidas pela mineração são ouvidas por deputados do Bloco Democracia e Luta
Uma das audiências foi realizada no âmbito da Comissão de Participação Popular nesta terça-feira (20/8/24). / Foto: Henrique Chendes/ ALMG

Denúncias de moradores atingidos pela atividade minerária nos municípios de São Joaquim de Bicas, Brumadinho, Ouro Preto, Mariana, Conceição do Mato Dentro (todos na Região Central) e comunidades do Vale do Jequitinhonha e do Norte de Minas foram ouvidas nesta terça-feira (20/8/24) em audiência da Comissão de Participação Popular da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG). A reunião foi requerida pelos deputados do Bloco Democracia e Luta, Leninha, 1ª vice-presidenta da Casa, Doutor Jean Freire, líder da Minoria, e Leleco Pimentel, todos do PT. 

LEIA: Serra do Curral de bandeja para mineradoras: saiba como Zema tem facilitado exploração criminosa

Entre os principais relatos feitos por indígenas, quilombolas, produtores rurais e populações urbanas impactados por barragens e atividades minerárias, destacam-se o descaso com a saúde dessas comunidades e a convivência diária com ameaças e agressões.

O frei Rodrigo Péret, membro da Rede Igrejas e Mineração, utilizou o termo “arquitetura de impunidade criada em torno do setor minerário” para definir a situação.  Ele questionou os acordos de reparação realizados em razão dos rompimentos das barragens em Brumadinho e Mariana, pois revitimizam o atingido ao fazê-lo negociar com a mineradora e aceitar os parâmetros impostos por ela. “Esses acordos colocam a empresa dentro do território, controlando a cena do crime”, enfatizou.

Para Valéria Carneiro, liderança do Assentamento Pastorinhas em Brumadinho, “a reparação é muito mais danosa que o crime em si. O crime tem dia e hora para terminar. A reparação abre o nosso território para a mineração”, disse. Ela acredita que exista hoje uma “indústria da reparação”. “Com o rompimento da barragem, a Vale entrou em todos os territórios que ela queria. O rompimento se tornou lucrativo.” 

Para o deputado Leleco Pimentel, um dos autores do requerimento que propôs a escuta dos atingidos, a mineração expulsa as comunidades dos territórios.

“Isso nos mostra a dimensão da destruição de políticas públicas em curso, como a reforma agrária. Também evidencia a violência da remoção dos povos de seus territórios. Um exemplo é Conceição do Mato Dentro, onde a comunidade foi assentada, reassentada e agora retirada novamente porque a água foi esgotada”. 

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Deputado Estadual Leleco Pimentel (PT)

Danos à saúde causados pela mineração são preocupação dos moradores

Após a entrada das mineradoras, relatos de doenças de pele e respiratórias aumentaram nas comunidades atingidas. Simone da Silva, da comunidade quilombola de Gesteira, e Henrique de Oliveira, da Aldeia Naôxohã, relataram que seus filhos apresentaram sintomas alérgicos e feridas, possivelmente ligados à contaminação. 

Djalma Gonçalves, do Povo Aranã Caboclo, destacou problemas respiratórios na comunidade Piauí Poço Dantas devido à extração de lítio e a poeira que fica suspensa no ar, afirmando que ‘o Vale do Jequitinhonha está sendo transformado em uma zona de sacrifício’. 

Já o agricultor Marino D’Angelo Júnior, representante da Comissão de Atingidos de Paracatu e Comunidades Rurais de Mariana, relatou sofrer problemas psicológicos após o rompimento da barragem. “Era uma pessoa simples, trabalhadora, mas tinha minha autonomia. Depois do rompimento, adoeci, tomo 3 antidepressivos”, afirmou.

Mineradoras ameaçam as comunidades

As lideranças comunitárias relataram ainda ameaças feitas pelas mineradoras. Cláudia Saraiva, liderança da comunidade Ponte das Almorreimas, em Brumadinho, afirmou: “A Vale quando não te compra, ela te persegue”. Ela teve sua casa desapropriada para construção de uma estação de captação de água após o rompimento. “Fui perseguida por denunciar tudo o que a Vale fazia de injustiças”, afirmou. 

De acordo com Cláudia, é prática das mineradoras infiltrar pessoas na própria comunidade para vigiar aqueles que se dizem contra a mineração. O método de coerção foi reafirmado por William de Souza, cacique Sucupira Pataxó e Pataxó Hã Hã Hãe, de São Joaquim de Bicas,“Eles entram dentro da comunidade e colocam os parentes uns contra os outros”. Ele consta como réu em um processo aberto pela Vale por tentar impedir a construção de uma estrada que atravessava o seu terreno.

De acordo com o cacique da Aldeia Arapowã Kakya Xucuru Kariri, em Brumadinho, Carlos José da Silva, “a mineradora nos intimidou com caçambas de barro e mais de 30 jagunços impedindo o acesso à comunidade”. Segundo ele, “a Vale diz que é dona do território”, mas isso não os impede de resistir.

Atuação das instituições de justiça é criticada

Matheus Leite, advogado da Federação das Comunidades Quilombolas de Minas Gerais, criticou a forte relação entre as instituições de justiça brasileiras e as mineradoras, afirmando que isso leva à impunidade e força os atingidos a buscarem justiça em tribunais internacionais.

Wagner Dias Ferreira, da Comissão de Direitos Humanos da OAB-MG, destacou o esforço da comissão em intensificar visitas aos territórios afetados para construir diálogos. Já Jonas Leal, do Ministério Público de Minas Gerais, enfatizou a importância de relatar violações às promotorias locais e mencionou a existência de mecanismos internos de controle, como a Ouvidoria do órgão, acessível pelo número 127.

Segundo o deputado Leleco Pimentel, entre os requerimentos da comissão a serem encaminhados, está o que vai requisitar proteção a todos os presentes à audiência em função das denúncias relatadas.

Comissão de Meio Ambiente discutiu atuação da Samarco em Ouro Preto e Mariana

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Projeto Longo Prazo da mineradora Samarco, que amplia as atividades da mineradora no Complexo de Germano, é criticado pelos atingidos. Foto: Daniel Protzner

Nesta segunda-feira (19/8/24), também foram debatidos impactos socioambientais referentes ao processo de licenciamento do Projeto Longo Prazo para a continuidade das operações da mineradora Samarco nos Municípios de Mariana e Ouro Preto. A audiência foi requerida pela também parlamentar do Bloco Democracia e Luta, Beatriz Cerqueira (PT).

Após quase nove anos do rompimento da Barragem do Fundão, em Mariana (Região Central), em 5 de novembro de 2015, a Samarco, mineradora responsável pelo desastre ambiental, quer dar continuidade a suas operações no local, bem como em Ouro Preto. O Projeto Longo Prazo está em fase de licenciamento para construção de pilha de rejeitos em Camargos e outras intervenções em Santa Rita Durão e Bento Rodrigues, todos Distritos de Mariana.

Os impactos socioambientais desse empreendimento da Samarco, joint-venture da Vale e da BHP Billiton, foram enfatizados durante reunião da Comissão de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável. A audiência pública ouviu pessoas dos distritos atingidos e entidades que as apoiam, todas críticas ao novo projeto minerário.

Bernardo Campomizzi, membro Conselhos Municipais de Desenvolvimento Ambiental (Codema) e do Patrimônio Cultural (Compat) de Mariana, criticou a falta de transparência da mineração na região, afirmando que os reais impactos nos distritos envolvidos não são claros. Ele destacou que a Samarco planeja retomar 100% de suas atividades, com aprovação parcial dos conselhos locais, embora essa expansão conflite com o plano diretor do município. 

Campomizzi alertou ainda para os riscos ambientais, como a supressão de 120 hectares de mata e o empilhamento de estéril de 140 metros de altura, que podem agravar a poluição e prejudicar a qualidade do ar. Ele questionou a escolha de Camargos para a pilha de estéril, a menos de 500 metros de casas, sem estudos de segurança adequados.

“Em Mariana, vemos uma ampliação da mineração, e não é possível prever medidas compensatórias, pois não conhecemos os impactos reais dessa atividade. É urgente que se faça um levantamento completo disso”

Bernardo Campomizzi, Membro do Codema e do Compat, de Mariana

Ameaças a sítios históricos e críticas à Samarco

Sobre o tema, Alenice Baeta, presidente do Centro de Documentação Eloy Ferreira da Silva (Cedefes), alertou que uma pilha de rejeitos ameaça o sítio histórico de Santa Rita Durão em Mariana, incluindo uma igreja tombada. Ela destacou que, em caso de colapso, a massa seca poderia inundar o local e o Rio Piracicaba. Alenice criticou a repetição de violações, lembrando o caso de Bento Rodrigues, onde a Samarco tenta remover os moradores, mas enfrenta resistência. “Bento Rodrigues é um sítio histórico e arqueológico importantíssimo e a Samarco, com o terrorismo de barragem, quer retirar as pessoas de lá, mas não consegue. Não podemos aceitar essa estratégia da despossessão”, declarou.

Atingidos pelo empreendimento tecem críticas à Samarco. Mônica Santos e Mauro da Silva, da Comissão de Atingidos de Bento Rodrigues, criticaram a Samarco por usar terrenos do distrito sem compensação e tentarem colocar a pilha de rejeitos em Bento Rodrigues, onde ainda vivem moradores. “Nossas terras estão servindo de depósito de rejeito sem recebermos um centavo e, do centro de Mariana, dará pra ver a pilha de estéril que querem construir”, alertou Mônica. 

Letícia Faria, coordenadora do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), afirmou que a mineração destruiu comunidades sem reparação adequada e agora busca expandir suas operações. Ela ainda afirmou que, no caso da mineração, o crime compensa. “A empresa destruiu comunidades, não pagou os atingidos, não reparou o meio ambiente e agora quer expandir o empreendimento”, lamentou.

Ana Cota, da comunidade de Antônio Pereira, de Ouro Preto, questionou a necessidade de continuar minerando em Minas Gerais, apontando os impactos negativos, enquanto Gilmar Nunes, da Assessoria Técnica Independente, reforçou o apoio técnico às comunidades para enfrentar a opressão das mineradoras.

Pressão

A deputada Beatriz Cerqueira criticou a pressão realizada pela mineradora pela aprovação do projeto. Segundo o secretário de Meio Ambiente de Mariana, Anderson Aguilar, a Samarco propôs pagar R$ 80 milhões ao município como compensação aos impactos ambientais e sociais.

“Depois de tanto tempo, a mineradora se sente tão empoderada que atua pela chantagem. Começa a pressionar, afirmando que o município receberá R$ 80 milhões se o projeto for aprovado”.

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Deputada Estadual Beatriz Cerqueira (PT)

Na conclusão, a deputada anunciou futuros requerimentos, entre os quais um pedido para que o Conselho do Patrimônio de Mariana não paute o projeto da Samarco na próxima reunião, em setembro. Disse que também requererá à Samarco que altere a localização das pilhas de rejeitos e dos equipamentos de exploração que podem causar impacto em comunidades próximas. E proporá visita às localidades onde se pretende construir as pilhas.

*Matéria elaborada com informações da ALMG

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