Durante audiência pública, trabalhadores da rede estadual de saúde relataram diferença de tratamento entre carreiras, desvalorização dos funcionários e sucateamento do serviço.
Na última quinta-feira (10/8/23), foi realizada uma audiência pública da Comissão de Participação Popular da Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), cuja finalidade foi debater a necessidade de valorização dos servidores da rede estadual de saúde. As principais demandas apresentadas foram: a reestruturação e melhorias do plano de carreira, isonomia de tratamento entre os servidores e correção salarial. A reunião partiu de um requerimento de autoria dos deputados Lohanna (PV), Celinho Sintrocel (PCdoB), Cristiano Silveira (PT), Doutor Jean Freire (PT), Leleco Pimentel (PT), Leninha (PT), Lucas Lasmar (Rede), Professor Cleiton (PV) e Ulysses Gomes (PT), todos do Bloco Democracia e Luta.
Dentre as denúncias feitas, estão os baixos salários dos funcionários. Segundo a deputada Lohanna, estudos do Sindicato dos Servidores da Saúde (Sind-Saúde) apontam que mais de 300 servidores da Secretaria de Estado de Saúde recebem menos que um salário mínimo. Enquanto isso o governador aumentou o próprio salário e de seu secretariado em 300%.
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A secretária-executiva da Mesa Estadual de Negociação Permanente do Sistema Único de Saúde (SUS), Núbia Roberta Dias, informou que quase 70% dos servidores do sistema já possuem idade para se aposentar ou já deveriam estar inativos, mas não o fazem porque, para a maioria, os adicionais e gratificações ultrapassam o valor do salário-base. Ao se aposentarem, eles perdem esses acréscimos.
O deputado Doutor Jean Freire, líder da Minoria, também destacou a desvalorização enfrentada por motoristas do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (Samu), que ganham apenas R$ 1,6 mil mensais. Para explicar o exemplo, o parlamentar, que é médico, relatou que esses profissionais não apenas dirigem os carros, mas, também, ajudam a organizar a ambulância e auxiliam os socorristas a carregar pacientes. “É um absurdo”, indignou-se sobre a remuneração.
Doutor Jean Freire também pontuou que a sociedade não sabe que o serviço de saúde vai além de médicos e enfermeiros de hospital. “Poucos pensam no porteiro, na recepcionista, nos servidores que fazem a limpeza ou trabalham no setor administrativo e em serviços burocráticos”, lamentou, ao lembrar que o serviço depende de uma rede mais ampla de trabalhos. Por isso, o deputado defendeu a união de deputados em uma bancada em favor da saúde.
Privatização disfarçada
Núbia Dias ressaltou a falta de uma política pública de valorização dos servidores da saúde e o desmonte no setor. Ela também criticou a falta de isonomia no tratamento entre servidores efetivos e terceirizados em funções similares. Exemplo disso são os 6,5 mil funcionários do Samu, contratados pelos consórcios municipais e não por meio de concursos. Isso acarreta em disparidades salariais e falta de garantias e direitos assegurados pelo serviço público.
Ariete Domingues de Araújo, médica e diretora financeira do Sindicato dos Médicos de Minas, também destacou outro elemento que colabora para o sucateamento do serviço e a precarização do vínculo empregatício: a passagem de serviços médicos para organizações sociais. De acordo com ela, os médicos passam a ser pessoa jurídica, perdem salário e segurança, além do maior risco de desvio de verbas públicas e queda de qualidade dos serviços.
Para o especialista em políticas públicas e gestão governamental Paulo Kliass, a transferência da gestão dos serviços de saúde pela terceirização é uma tática de disfarçar a privatização. “Uma política tão fundamental não pode ser tocada pelo interesse do capital privado, que é basicamente o lucro”, condenou.
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O especialista em Políticas e Gestão da Saúde da Secretaria de Estado de Saúde, Yuri de Aguiar Moura, admitiu que as carreiras foram pouco atualizadas nos últimos anos, gerando inadequações e gargalos. Ele afirmou que um plano de revisão já foi encaminhado para a Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão (Seplag).
Sem recursos para a saúde, mas dinheiro de sobra para interesses próprios
Representante do Poder Executivo na audiência pública, a assessora-chefe de Relações Públicas da Seplag, Helga Beatriz Gonçalves de Almeida, reafirmou que a secretaria já recebeu propostas de reestruturação das carreiras, mas alegou que o executivo tem tido dificuldades para reunir os recursos necessários para recompor as perdas inflacionárias.
Contudo, a motivação dada pela representante do governo foi questionada pela deputada Lohanna. A parlamentar criticou que o governador sempre apresenta as dificuldades financeiras como desculpa para não atender as demandas dos servidores, mas abre mão de receitas como a repassada pela União pelo ICMS da Educação.
“Enquanto o governador diz que não tem recursos, já perdemos mais de R$ 2 bilhões do ICMS da educação porque não foi regulamentado.”
Ela também lembrou que o governador aumentou em 300% o próprio salário e os dos seus secretários, além de abrir mão de cerca de R$ 1 bilhão em isenções fiscais para locadoras de automóveis. “Esse argumento não para em pé”, declarou.
Fonte: ALMG